5 perguntas a João Pereira Coutinho

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Jornalista, cientista político, professor da Universidade Católica Portuguesa e autor do livro As ideias conservadoras explicadas a revolucionários e reacionários, Três Estrelas, 2014, 128 págs.

Por Diogo Chiuso

Em termos práticos: o que é ser conservador?
Ironicamente, é não pensar muito no assunto. Quase todas as ideologias exigem uma dose de energia e de vontade transformadora que ocupa a mente de forma obsessiva. Isso é especialmente válido para a família socialista, embora muitos liberais também padeçam dessa doença: a ridícula noção de que tudo é político, mesmo os aspectos mais pessoais ou até íntimos da conduta humana. Um conservador recusa esse espírito de guerrilha contra o mundo tal como ele é, excepto quando o mundo inicia as hostilidades.

Atualmente, no Brasil, há uma reação contra um establishment político corrupto e cheio de privilégios. A população foi às ruas pedindo mudanças drásticas no sistema político atual, mas também apoia e pede o fortalecimento das instituições como o Ministério Público Federal que investiga a corrupção. Poderíamos dizer que essa postura é uma espécie de reação conservadora?
Não creio. É uma reacção da sensatez, da vontade de viver num país mais decente, do cansaço com a roubalheira e a impunidade. Não é preciso ser conservador para reagir contra a iniquidade. Basta ter os neurónios em funcionamento. Agora, se o Brasil pensa que os seus problemas se resolvem com mudanças no sistema político ou com reformas de certas instituições, lamento: não se resolvem. Essas mudanças e essas reformas podem ser fundamentais, óbvio, mas a crise brasileira é, primeiro que tudo, uma crise moral. E esse tipo de crise é infinitamente mais difícil de resolver do que crises políticas ou económicas.

Por outro lado, há uma tendência no recente meio conservador brasileiro de se idealizar o passado, com glórias e heróis, para servir de modelo político ideal. Isso seria um elemento utópico que também traz consigo a ideia de sociedade perfeita, ao invés de uma tentativa de se buscar uma solução prática para os problemas atuais?
É a tentação da “mente naufragada”, para usar uma expressão do Mark Lilla: para certos indivíduos, os problemas do presente só têm solução por um retorno ao passado – a um passado que se imagina mais perfeito, mais justo, mais civilizado etc. etc. É uma nostalgia infantil – e infantil no sentido exacto da palavra: uma busca do conforto e da segurança que muitos experimentaram na infância e que procuram recriar na idade adulta. Infelizmente, esse passado é uma construção fantasiosa do nosso medo e da nossa frustração. Os problemas do presente só podem ser resolvidos com os recursos do presente.

No seu livro, As ideias conservadoras, você explica, citando Benjamin Disraeli, que um conservador não é contrário às mudanças na sociedade, pelo contrário, sabem que elas são inevitáveis. A diferença é que acreditam ser preciso considerar sempre os costumes, as leis e a tradição de um povo. Como, então, seria possível uma via conservadora no Brasil, um país que parece já ter perdido os seus costumes, leis e tradições?
O meu livro lidava com uma particular tradição conservadora: a britânica. Porém, existem certos ensinamentos que transcendem o seu contexto e têm uma validade intemporal. Se aceitarmos, por exemplo, que os homens são intelectualmente imperfeitos, isso tem implicações imediatas na forma como se pensa a política. Provavelmente, tenderemos a olhar com maior desconfiança para o gigantismo do Estado e para o voluntarismo dos governantes. Passaremos a exigir instituições capazes de contrabalançar os excessos do governo, como um judiciário independente, uma mídia vigilante, uma sociedade civil emancipada etc, etc.

5. Até que ponto as ideias conservadoras são opostas ao secularismo?
Mas quem disse que são? A separação entre o Estado e a Igreja é um adquirido civilizacional. Existem tradições conservadores que não fizeram as pazes com a modernidade, eu sei. Mas, uma vez mais, estamos a falar de “mentes naufragadas”. Dar a Deus o que é de Deus e a César o que é de César (um preceito bíblico, aliás) é uma forma de garantir a necessária autonomia de Deus e de César. Quem quer seguir o caminho do Islã político?

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Foto: divulgação – jpcoutinho.com
13/01/2018

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